8 de março de 2008

Peça O Despertar

A Maré é composta por 16 comunidades, com um total de 130 mil habitantes e no quesito cultura esta muito bem representada. Temos atores, dançarinos, artistas plásticos, poetas, músicos, modelos, fotógrafos... Mesmo assim, ainda somos vistos pelo que não temos, somos sempre vistos pela falta, pela carência. Mas, temos esperança que essa forma de nos ver um dia mude e para isso o povo daqui tem feito sua parte, seja no teatro, na dança, na música, na fotografia, no audiovisual, no esporte e em outras atividades artísticas e não artísticas.

Recentemente escrevi um relato para o site do Observatório sobre a Peça de teatro "Qual É a Nossa Cara"? da CIA Marginal, venho novamente para escrever sobre O Despertar. Ambas apresentadas na Casa de Cultura da Maré. A peça O Despertar foi apresentada nos dias 8 e 9 de março de 2008, em homenagem ao dia Internacional da Mulher. A peça O Desperta aborda o tema da violência domestica, uma realidade vivida por milhares de mulheres. O enredo da peça acontece em uma favela, à obra aborda ainda outras violências vividas pelos moradores desses espaços.

Personagens

O enredo da peça gira em torno de Maria. Maria é casada com Antônio com quem tem dois filhos. Antônio é um homem machista e violento, ele acha que o dever da mulher casada é obedecer e servi exclusivamente ao marido. Maria influenciada por sua amiga de infância Joana que é professora e feminista, volta a estudar e a fazer aulas de dança, realizando um antigo sonho. Além de voltar a estudar e fazer aulas de dança Maria ainda consegue um emprego na academia em que dança. A partir desse ponto a relação de Maria com Antônio se agrava. Antônio “cabra macho” não se conforma em ver sua esposa fazer tudo o que ele considera ser coisa de mulher sem prestigio. Antonio passa parte de sua vida nos bares bebendo, ao ver sua esposa trabalhar, estudar e fazer aulas de dança passa a agredi-la com mais freqüência. Maria é encorajada por Joana a denunciá-lo, mas desiste por medo do companheiro. Maria apaixona-se por Reinaldo seu professor e patrão. Antônio ao descobrir fica enfurecido e tenta matar Reinaldo.

A peça

A peça foi escrita por Kelly Regis, inspirada na lei nº 11.340/06, conhecida como "Lei Maria da Penha" e adaptada por Ivano Manzan. A pesar de tratar de um assunto de interesse publico não recebeu nenhum apoio financeiro, foi realizada graças ao empenho e a boa vontade dos artistas em levar a arte ao publico. O cenário foi todo produzido com materiais recicláveis, desde as paredes até os bancos utilizados na decoração da casa da personagem Maria.

Além da apresentação, também fotografei alguns dos ensaios, acompanhei de perto o trabalho dos atores durante as duas últimas semanas de preparação, os esforços dos artistas para a exibição da obra foi árduo. A luz e som foram montados faltando menos de quatro horas para a apresentação de abertura. A peça tem uma duração de uma hora e trinta minutos, algumas das cenas deixaram a desejar devido as condições do espaço e a precária iluminação. Os artistas merecem aplausos por suas atuações dentro e fora do palco. Para se realizar uma obra de arte com a complexidade que é O Despertar é preciso dos recursos necessários. É preciso ainda de um espaço adequado, coisa que a Maré não tem.

Participação Especial

A peça contou com a participação especial de ex-integrantes do Corpo de Dança da Maré. O corpo de Dança foi um grupo que teve seu auge nos anos de 2000 a 2004 O grupo chegou a ter 70 dançarinos e realizou três grandes espetáculos apresentados no Rio e em São Paulo (Mãe Gentil 2000 / Folias Guanabara 2001) e Dança das Marés em 2002. Ultimo grande espetáculo do grupo.

O corpo de Dança da Maré é um exemplo, sem incentivos os artistas não chegam muito longe. De nada adianta boa vontade, coisa que não falta no grupo da peça O Despertar. É essencial que grupos como Cia Marginal, O Despertar e outros recebam apoio financeiro para continuarem produzindo seus trabalhos que são de suma importância para o desenvolvimento da comunidade. Assim se constrói e fortalece cidadania.

Temos esperança que as favelas um dia sejam vistas pelo que tem de melhor: na música, na dança, nas artes plásticas, no teatro, no esporte e nas demais atividades que nos engrandecem. Mas para isso acontecer, além da garra que sempre foi uma marcar das pessoas desses espaços é preciso que sejamos vistos pelo que temos de melhor, e não da forma simplista e preconceituosa que somos vistos.

Mesmo diante de todos os problemas a peça O Despertar foi um belo espetáculo apresentado a comunidade da Maré. Quem não viu ainda terá a oportunidade de ver, pois o grupo pretende apresentar a obra em outros espaços do Rio de Janeiro.

Galeria de fotos "Peça O Despertar"

Valdean


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