23 de outubro de 2009

Manifesto em defesa do MST

É marca registrada dos impérios de comunicações transformar assuntos de interesse dos grupos dominantes em interesse geral da nação.

Menos de 10 segundos de imagens é o ponto de partida para os ataques da imprensa ao movimento.

Em defesa do movimento intelectuais de todo o mundo e do Brasil elaboram manifesto.


Manifesto em defesa do MST

“...Legitimam-se não pela propriedade, mas pelo trabalho,
nesse mundo em que o trabalho está em extinção.
Legitimam-se porque fazem História,
num mundo que já proclamou o fim da História.
Esses homens e mulheres são um contra-senso
porque restituem à vida um sentido que se perdeu...”
(“Notícias dos sobreviventes”, Eldorado dos Carajás, 1996).

A reconstrução da democracia no Brasil tem exigido, há trinta anos, enormes sacrifícios dos trabalhadores. Desde a reconstrução de suas organizações, destruídas por duas décadas de repressão da ditadura militar, até a invenção de novas formas de movimentos e de lutas capazes de responder ao desafio de enfrentar uma das sociedades mais desiguais do mundo. Isto tem implicado, também, apresentar aos herdeiros da cultura escravocrata de cinco séculos, os trabalhadores da cidade e do campo como cidadãos e como participantes legítimos não apenas da produção da riqueza do País (como ocorreu desde sempre), mas igualmente como beneficiários da partilha da riqueza produzida.

O ódio das oligarquias rurais e urbanas não perde de vista um único dia, um desses novos instrumentos de organização e luta criados pelos trabalhadores brasileiros a partir de 1984 o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra – MST. E esse Movimento paga diariamente com suor e sangue – como ocorreu há pouco no Rio Grande do Sul, por sua ousadia de questionar um dos pilares da desigualdade social no Brasil o monopólio da terra. O gesto de levantar sua bandeira numa ocupação, se traduz numa frase simples de entender e, por isso, intolerável aos ouvidos dos senhores da terra e do agronegócio. Um País, onde 1% da população tem a propriedade de 46% do território, defendida por cercas, agentes do Estado e matadores de aluguel, não podemos considerar uma República. Menos ainda, uma democracia.

A Constituição de 1988 determina que os latifúndios improdutivos e terras usadas para a plantação de matérias primas para a produção de drogas, devem ser destinados à Reforma Agrária. Mas, desde a assinatura da nova Carta, os sucessivos Governos têm negligenciado o seu cumprimento. À ousadia do MST de garantir esses direitos conquistados na Constituição, pressionando as autoridades através de ocupações pacíficas, soma-se outra ousadia, igualmente intolerável para os senhores do grande capital do campo e das cidades a disputa legítima e legal do Orçamento Público.

Em quarenta anos, desde a criação do INCRA (1970), cerca de um milhão de famílias rurais foram assentadas. Mais da metade, entre 2003 e 2008. Para viabilizar a atividade econômica dessas famílias, para integrá-las ao processo produtivo de alimentos e divisas no novo ciclo de desenvolvimento, é necessário travar a disputa diária pelos recursos públicos. Daí resulta o ódio dos ruralistas e outros setores do grande capital, habituados desde sempre ao acesso exclusivo aos créditos, subsídios e ao perdão periódico de suas dívidas.

O compromisso do Governo de rever os critérios de produtividade para a agricultura brasileira, responde a uma bandeira de quatro décadas de lutas dos movimentos dos trabalhadores do campo. Ao exigir a atualização desses índices, os trabalhadores do campo estão apenas exigindo o cumprimento da Constituição Federal, e que os avanços científicos e tecnológicos ocorridos nas últimas quatro décadas, sejam incorporados aos métodos de medir a produtividade agrícola do nosso País.

É contra essa bandeira que a bancada ruralista do Congresso Nacional reage, e ataca o MST. Como represália, buscam, mais uma vez, articular a formação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) contra o MST. Seria a terceira em cinco anos. Se a agricultura brasileira é tão moderna e produtiva – como alardeia o agronegócio, por que temem tanto a atualização desses índices?

E, por que não é criada uma única CPI para analisar os recursos públicos destinados às organizações da classe patronal rural? Uma CPI que desse conta, por exemplo, de responder a algumas perguntas, tão simples como O que ocorreu ao longo desses quarenta anos no campo brasileiro em termos de ganho de produtividade? Quanto a sociedade brasileira investiu para que uma verdadeira revolução – do ponto de vista de incorporação de novas tecnologias – tornasse a agricultura brasileira capaz de alimentar nosso povo e se afirmar como uma das maiores exportadoras de alimentos? Quantos perdões da dívida agrícola foram oferecidos pelos cofres públicos aos grandes proprietários de terra, nesse período?

O ataque ao MST extrapola a luta pela Reforma Agrária. É um ataque contra os avanços democráticos conquistados na Constituição de 1988 – como o que estabelece a função social da propriedade agrícola – e contra os direitos imprescindíveis para a reconstrução democrática do nosso País. É, portanto, contra essa reconstrução democrática que se levantam as lideranças do agronegócio e seus aliados no campo e nas cidades. E isso é grave. E isso é uma ameaça não apenas contra os movimentos dos trabalhadores rurais e urbanos, como para toda a sociedade. É a própria reconstrução democrática do Brasil, que custou os esforços e mesmo a vida de muitos brasileiros, que está sendo posta em xeque. É a própria reconstrução democrática do Brasil, que está sendo violentada.

É por essa razão que se arma, hoje, uma nova ofensiva dos setores mais conservadores da sociedade contra o Movimento dos Sem Terra – seja no Congresso Nacional, seja nos monopólios de comunicação, seja nos lobbies de pressão em todas as esferas de Poder. Trata-se, assim, ainda uma vez, de criminalizar um movimento que se mantém como uma bandeira acesa, inquietando a consciência democrática do país a nossa democracia só será digna desse nome, quando incorporar todos os brasileiros e lhes conferir, como cidadãos e cidadãs, o direito a participar da partilha da riqueza que produzem ao longo de suas vidas, com suas mãos, o seu talento, o seu amor pela pátria de todos nós.

CONTRA A CRIMINALIZACÃO DO MOVIMENTO DOS SEM TERRA.

PELO CUMPRIMENTO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS QUE DEFINEM AS TERRAS

DESTINADAS À REFORMA AGRÁRIA.
PELA ADOCÃO IMEDIATA DOS NOVOS CRITÉRIOS DE PRODUTIVIDADE PARA FINS DE

REFORMA AGRÁRIA.

Brasília, 21 de setembro de 2009


Assinam esse documento


Eduardo Galeano - UruguaiIstván


Mészáros - Inglaterra


Ana Esther Ceceña - México


Boaventura de Souza Santos - Portugal


Daniel Bensaid - França


Isabel Monal - Cuba


Michael Lowy - França


Claudia Korol - Argentina


Carlos Juliá – Argentina


Miguel Urbano Rodrigues - Portugal


Ignacio Ramonet - Espanha


Jorge Beinstein - Argentina


Carlos Aguilar - Costa Rica


Ricardo Gimenez - Chile


Pedro Franco - República Dominicana



Brasil


Antonio Candido


Ana Clara Ribeiro


Anita Leocadia Prestes


Andressa Caldas


André Vianna Dantas


André Campos Búrigo


Augusto César


Carlos Nelson Coutinho


Carlos Walter Porto-Gonçalves


Carlos Alberto Duarte


Carlos A. Barão


Cátia Guimarães


Cecília Rebouças Coimbra


Ciro CorreiaChico Alencar


Claudia Trindade


Claudia Santiago


Chico de Oliveira


Demian Bezerra de Melo


Emir Sader


Elias Santos Eurelino Coelho


Eleuterio Prado



Fernando Vieira Velloso


Gaudêncio Frigotto


Gilberto Maringoni


Gilcilene Barão



Irene Seigle



Ivana Jinkings



Ivan Pinheiro



José Paulo Netto



Leandro Konder



Luis Fernando Veríssimo



Luiz Bassegio



Luis Acosta



Lucia Maria



Wanderley Neves



Marcelo Badaró Mattos


Marcelo Freixo


Maria Rita Kehl


Marilda Iamamoto


Mariléa Venancio


Porfirio Mauro Luis Iasi


Maurício Vieira Martins


Otília Fiori Arantes


Paulo Arantes


Paulo Nakatani


Plínio de Arruda Sampaio


Plínio de Arruda Sampaio Filho


Renake Neves


Reinaldo A. Carcanholo Ricardo Antunes


Ricardo Gilberto Lyrio


Teixeira Roberto Leher


Roberto SchwarzSara Granemann


Sandra Carvalho


Sergio Romagnolo


Sheila Jacob


Virgínia Fontes


Vito Giannotti




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