Em tese os sistemas sociais modernos desenvolveram mecanismos que dispensa o recurso arcaico de murar. Em compensação ergueu muralhas que separam, não mais os bárbaros dos cidadãos, como relata a história a respeito da função dos muros das cidades medievais. O medo que o rico tem do pobre é a principal evidencia da terrível muralha que protege o rico e segrega o pobre.
Murar o espaço público está na moda na cidade do Rio, não qualquer espaço, evidente, as áreas escolhidas são as áreas das favelas e não por acaso, se nos ocuparmos em observar as práticas da cidade em relação aos espaços favelados, veremos que o pensamento é totalmente coerente com a lógica vigente de que a cidade tem um problema e esse “problema” é a favela.
Pior do que a caduca ideia de murar, só os argumentos dos governos na defesa dos projetos. A intenção de murar as favelas não é nenhuma novidade, já foi proposta de outros governos, mas não foi realizada, em parte por falta de apoio da população, mas um fato novo é acrescido, antes o projeto não tinha a seu favor as boas intenções como capa de apresentação.
Com a pretensa intenção de proteger a mata atlântica do fenômeno favela é erguido muros de quase três metros de altura nas cercanias de favelas da zona sul da cidade. O projeto é de esfera estadual, mas pelo visto as boas intenções também circulam na esfera municipal. No final de 2009 o governo municipal anunciou a construção de muros em vias públicas da cidade, muros chamados de barreiras de contensão sonora que tem por função proteger os moradores das favelas da poluição sonora das vias. Ora, se mergulharmos nos arquivos da história dessa cidade não encontraremos nenhum rascunho que comprove a sensibilidade, conjunta dos governos, com os problemas das favelas e não é de se estranhar tamanha atenção com o problema da poluição sonora das vias nas proximidades das favelas.
Os atuais governos, estadual e municipal, encontraram a forma ideal para implementar o velho projeto de murar as favelas. É bem verdade que o projeto ganhou nova roupagem e parece ter duas etapas. A primeira transita no campo das boas intenções, e a segunda, essa de nível operacional é dividida em duas etapas, a principio, a primeira nada tem haver com a segunda, mas se juntarmos as peças é simples: primeiro cerca a favela por cima para proteger a mata atlântica da favela e por baixo cerca as vias para proteger a favela da poluição sonora.
Murar as vias públicas não resolve qualquer problema existente na cidade, se quer resolve a paranóia coletiva de que a favela é um “perigo”. A favela da Maré fica entre três vias: Linha Amarela, Linha Vermelha e Avenida Brasil, mas apenas pequenos trechos das construções são próximo dessas vias. Ou seja, a construção de um muro ou barreira de contenção sonora nestas vias com base em tal argumento não tem o menor sentido.
A vivência de um cotidiano brutalmente atingido pelo chorume expelido pelas forças de poderes que deságuam nas favelas é o suficiente para concluir que a boa “intenção” que norteiam o projeto é no mínimo demagógica. O projeto que se traveste de bem intencionado é na verdade a concretização do anseio de um grupo que dissemina a ideia de que a favela é uma grande “ameaça”. Em resumo, na ótica desse pensamento a favela é um terrível “problema” para cidade e precisa ser controlada/contida a qualquer custo.
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